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domingo, 10 de março de 2013

UMA VISÃO NOVA E EXTRAORDINÁRIA DO UNIVERSO


Ciclos de tempo - Uma visão nova e extraordinária do Universo” é o novo livro do físico-matemático inglês Roger Penrose, publicado pela Gradiva na sua premiada colecção “Ciência Aberta", com o nº. 198. Neste livro, o prestigiado físico-matemático Inglês propõeum novo modelo cosmológico do universo.

Esta primeira edição portuguesa de “Ciclos de tempo” (Fevereiro de 2013) foi traduzida por Nelson Rei Bernardino a partir da obra original inglesa publicada primeiramente em 2010. É pois um livro bem recente (ler um excerto aqui), escrito de forma cativantemente rigorosa por Roger Penrose, cientista octagenário, conhecido do grande público por várias e notáveis obras de divulgação científica que alcançaram reconhecimento do grande público e êxito mundial. Esta obra adiciona-se a outras três do mesmo autor também publicadas entre nós pela Gradiva, a saber: “A Mente Virtual”, “A Natureza do Espaço e do Tempo” e “O Grande, o Pequeno e a MenteHumana”.

Na sua carreira científica Penrose distinguiu-se sobretudo pelas contribuições para a cosmologia em geral e em particular a relatividade geral. «Autor de várias descobertas que em muitos casos criaram conceitos baptizados com o seu nome, entre eles as escadas de Penrose ou as desigualdades de Penrose».

Neste livro Roger Penrose aborda «um dos mistérios mais profundos do nosso universo» que «é o enigma da sua origem». Está estruturado em três partes intituladas “O mistério da segunda lei”, “O carácter curiosamente especial do Big Bang” e “Cosmologia cíclica conforme”. O livro inclui ainda dois apêndices, de leitura naturalmente facultativa, devido aos seus cálculos tecnicamente mais complexos.



Nesta obra Penrose descreve não só “os principais modelos da cosmologia relativista clássica, mas também vários desenvolvimentos e enigmas que surgiram desde a descoberta da radiação cósmica de fundo”, a qual veio transformar a cosmologia numa ciência exacta e sustentado a ideia de que este universo terá tido origem no evento designado por Big Bang.

Ao longo de 275 páginas são revistas e analisadas, progressivamente e de forma rigorosa,questões que estão na fronteira da cosmologia actual: o que veio antes do Big Bang e o que estará para lá dos buracos negros.

Através de uma análise abrangente da segunda lei da termodinâmica, que nos acompanha ao longo de todo o livro, e da geometria do espaço-tempo, Roger Penrose propõe um modelo cosmológico do universo – a Cosmologia Cíclica Conforme - em que a «expansão acelerada do nosso Universo pode ser interpretada como o Big Bang de um novo mundo».

A segunda lei da termodinâmica é um princípio físico-químico segundo o qual «as coisas vão ficando cada vez mais desorganizadas à medida que o tempo passa». Ou seja, e por outras palavras, esta lei descreve a tendência continuamente crescente da «desordem» no Universo, ou, de um modo um pouco mais rigoroso, descreve o aumento de entropia com o tempo num sistema isolado.

A nova proposta cosmológica de Penrose (a cosmologia cíclica conforme), integradora do conhecimento actual, merece uma leitura atenta e reflexão crítica: ajuda-nos a compreender o Universo de que fazemos parte, e contribui para a reflexão filosófica de sempre sobre a sua origem e natureza da sua evolução.

Este livro é, assim, de leitura imprescindível para uma actualização sobre o nosso conhecimento do Universo, desde antes do passado ao futuro do tempo no espaço, do infinitamente pequeno intangível da física de partículas ao astronomicamente longínquo das fronteiras em expansão.

António Piedade

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Ondas gigantes e o canhão submarino da Nazaré



Já se imaginou a surfar uma onda com 30 metros na costa portuguesa?

As maiores ondas oceânicas, em altura, ao longo de toda a costa portuguesa verificam-se, de forma mais majestosa e frequentemente, na região definida pela Praia do Norte, na vila da Nazaré. Importa dizer que a física das ondas é matéria complexa, pela influência de inúmeros factores como sejam, entre outros, a temperatura e salinidade das águas à superfície e no fundo marinho, amplitudes das marés, correntes marítimas, riqueza e diversidade da biomassa (algas, plâncton, etc.) que reduz a tensão superficial da água, o contexto geológico e oceanográfico. Neste último caso, o imponente Canhão Submarino da Nazaré, um dos maiores do mundo, desempenha um papel decisivo na circulação regional das massas de água e sedimentos e, logo, influência a formação de ondas.

O investigador Luís Quaresma dos Santos, autor da tese “Observação De Ondas Internas Não-Lineares Geradas Sobre O Canhão Submarino Da Nazaré” (2006, Departamento de Física da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) caracteriza assim o gigantesco acidente geográfico submarino: “De entre uma dezena de canhões existentes na margem continental portuguesa, o da Nazaré é sem dúvida o mais imponente. Para além de ser um dos maiores do mundo, ele rasga por completo a plataforma continental, perpendicularmente à costa, e estende-se por mais de 220 km. A Norte do canhão a plataforma é estreita (40-50 km) e plana, com um declive médio da ordem de 0.3 %. A Sul do canhão a plataforma torna-se ainda mais estreita e menos profunda, apresentando-se confinada pelo Cabo Carvoeiro (Peniche) e as Ilhas das Berlengas”.

Devido à configuração do Canhão, “observa-se a propagação de uma maré interna de grande amplitude ao longo do seu domínio interno, assim como uma redução da amplitude da maré junto da costa da Nazaré”, descreve aquele investigador. Este trabalho pioneiro sobre o canhão, caracterizou pela primeira vez a propagação de ondas internas solitárias não-lineares (C-NIWs) sobre a plataforma continental média, a Norte do canhão submarino da Nazaré. O próprio canhão parece desempenhar um papel condutor destas ondas, que se “distinguem das restantes por uma amplitude superior (alcançando os 30 m) e pela indução de pulsos de corrente com maior intensidade junto ao fundo (0,1-0,2 m/s)”. As ondas, designadas por solitões, “são observadas em grupo ou trens de onda. No Canhão da Nazaré os trens C-NIWs são constituídos por duas a três ondas, com períodos de 5 a 10 minutos e amplitudes de 10 a 30 m. Ocorrem predominantemente “entre o fim da Primavera e o início do Outono, acompanhando o aparecimento de um termoclina sazonal”, pelo que esta altura é propícia à formação das ondas de grande amplitude e período, um grande potencial a esta zona costeira para a prática da modalidade de surf “tow-in” em ondas gigantes.

E foi neste contexto ondulatório que o surfista havaiano Garret McNamara conseguiu entrar para o Guiness Book of Records, ao surfar uma onda com cerca de 30 metros de altura na zona da costa conhecida como Norte do Canhão, no dia 1 de Novembro de 2011.

Desde então, as ondas gigantes que se formam no Canhão da Nazaré passaram a ser alvo de atracção mundial e o sonho de muitos surfistas.

António Piedade

As cidades afectam as temperaturas por milhares de quilómetros

Locations and area-averaged energy consumption of the 86 model grid points used in the perturbation runs.


O calor gerado no dia-a-dia pela actividade huamana e pelo consumo energético nas grandes áreas metropolitanas, influencia sistemas atmosféricos principais e críticos. 
Isto, segundo um estudo publicado na última edição de 27 de Janeiro da revista “Nature Climate Change”, afecta as temperaturas ao longo de milhares de quilómetros ao redor dos centros urbanos, o que significa que algumas áreas aquecem enquanto outras arrefecem. 
Esta influência das cidades sobre problemas relacionados com o aquecimento global tem sido pouco considerada, ainda segundo este estudo.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

"A Photographia Atravez Dos Corpos Opacos"





Os últimos 150 anos foram marcados por importantes descobertas científicas que mudaram paradigmas e o dia-a-dia da sociedade em que vivemos. Contrastando com essa mudança, pode afirmar-se que, de um modo geral, a imprensa portuguesa sempre tratou com indiferença, expresso em particular na falta de rigor, o avanço da ciência produzida quer aquém, quer além fronteiras, assim como os cientistas que o protagonizaram.

Exemplo disso é o silêncio jornalístico ao redor da visita de Albert Einstein a Lisboa, a 11 de Março de 1915: nem uma única linha foi escrita pela imprensa portuguesa, e só sabemos dela através de notas do seu diário.

À procura de eventuais e raríssimas excepções, encontra-se uma e logo muito interessante, que está documentada no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra (aqui) e que é contextualizada no livro “Breve História da Ciência em Portugal”, de Carlos Fiolhais e Décio Martins, publicado este ano pela Imprensa da Universidade de Coimbra e pela Gradiva.

Na primeira página do jornal O Século de 1 de Março de 1896, foi publicado um artigo extenso sob o título “A Photographia atravez dos corpos opacos” (reproduzida num artigo de Décio Martins na página do Instituto Camões l). Nele, noticiavam-se os resultados da aplicação médica de raios X, obtidos pela primeira vez em Portugal e na Universidade de Coimbra, em Fevereiro de 1896, pelo físico Henrique Teixeira Bastos.

Esta notícia e o seu conteúdo são espantosos pelo facto de os raios X só terem sido descobertos por Roentgen, três meses antes, a 8 de Novembro de 1895, em Wuerzburg, na Baviera, Alemanha. Isto significa não só que Teixeira Bastos e os seus pares portugueses estavam em contacto atento e na vanguarda do conhecimento da estrutura da matéria e das radiações electromagnéticas, mas também que existiam, no então Gabinete de Física Experimental da Universidade de Coimbra, as condições necessárias para a reprodução e validação experimental das últimas descobertas científicas. Sabe-se que esta actualidade científica deve muito aos contactos e viagens internacionais mantidas pelo físico António dos Santos Viegas, também professor em Coimbra (durante mais de 50 anos).

A notícia n' O Século implica ainda existir nessa época uma profícua colaboração interdisciplinar entre a Faculdade de Filosofia (que então albergava ciências como a Física) e a Faculdade de Medicina. De facto, essa relação de partilha de conhecimento resultou numa rápida aplicação médica das descobertas sobre a estrutura atómica que foi materializada com a criação em 1901, curiosamente o ano em que Roentgen recebe o primeiro prémio Nobel da Física (aqui), do Gabinete de Radioscopia e Radiografia no Hospital da Universidade de Coimbra.

Alguns dos instrumentos utilizados nas experiências então noticiadas podem ser vistos na exposição permanente do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra bem assim como no recentemente reaberto Gabinete de Física do século XVIII (aqui), com uma sala do século XIX, pertencente ao mesmo Museu.


Legenda da fotografia: Mão direita de um rapaz que sofre de tuberculose óssea”.


António Piedade, escrito a 11 de Outubro e publicado primeiramente no Ciência Hoje

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Prémio Nobel da Física

Andre Geim
Konstantin Novoselov





The Nobel Prize in Physics 2010 Andre Geim, Konstantin Novoselov







Andre Geim          Konstantin Novoselov



The Nobel Prize in Physics 2010 was awarded jointly to Andre Geim and Konstantin Novoselov "for groundbreaking experiments regarding the two-dimensional material graphene"

domingo, 26 de setembro de 2010

TELETRANSPORTE



Q
uantas vezes não desejamos poder viajar instantaneamente entre o lugar em que nos encontramos e um outro mais aprazível e distante, num abrir e fechar de olhos? Viajar à velocidade do pensamento, como se fosse possível materializarmo-nos no local distante desejado, foi e é tema recorrente de muitas obras de ficção científica. Entre elas, talvez a mais conhecida que utiliza esta ideia tenha sido “O Caminho das Estrelas” (Star Treck, no original inglês), série de ficção científica primeiramente feita para televisão na década de 80 do século passado e mais tarde transposta para o cinema. Em “O Caminho das Estrelas”, os famosos tripulantes da nave U.S.S. Enterprise (ver foto) tinham a possibilidade de, para além de viajarem pelo espaço a velocidades enormes, se teletransportarem entre a nave (na sala de transporte) e um local escolhido de um planeta visitado, ou para a sala de transporte de uma outra nave. Para isso bastava colocarem-se em locais apropriados da sala de transporte e, depois de o operador seleccionar o destino pretendido e premir um simples botão, um feixe de energia desmaterializava os personagens que se “evaporavam” da nave para depois voltarem a corporizar-se no local distante escolhido. Esta viagem era efectuada num piscar de olhos e, aparentemente, os viajantes não sofriam quaisquer danos. Na imaginação dos autores da série, o processo de teletransporte consistia em recolher a informação total sobre a composição do viajante, em que a posição relativa de cada átomo era rastreada. Toda a informação era então primeiramente transferida como se fosse uma transmissão de televisão e, imediatamente a seguir, concentrada no local de destino onde os átomos do viajante eram novamente colocados na posição correcta como se se tratassem de peças de Lego.
Apesar de o teletransporte de matéria organizada continuar a ser algo que só existe no imaginário da ficção científica, este assunto tem sido alvo do interesse de várias equipas de cientistas. Contudo, estes deparam-se com vários problemas teóricos e tecnológicos, entre os quais existe um que pertence ao domínio da Física Quântica, fundamental e intrínseco à própria natureza da matéria e que foi enunciado pelo Físico Heisenberg. Designado por “princípio da incerteza”, o seu conteúdo diz-nos que não é possível saber simultaneamente a posição e a energia de uma partícula subatómica com a mesma precisão. Isto é assim uma vez que para sabermos a posição de uma partícula é necessário observá-la e para isso é necessário interagir com ela de alguma forma. Ao fazê-lo estamos, contudo, a alterar alguma coisa: a posição dela ou a sua energia. A implicação disto para o assunto do teletransporte é o de que existe esta barreira de incerteza para que possamos construir um equipamento que consiga recolher simultaneamente toda a informação sobre a posição e a energia das partículas que nos compõem, para depois poder de alguma forma enviar essa informação para outro lugar e reconstruir uma cópia exacta!
Desde há alguns anos o Professor Anton Zeilinger, da Universidade de Viena, na Áustria, tem vindo a trabalhar e a desenvolver idéias sobre “Teletransporte Quântico” (http://www.quantum.univie.ac.at/zeilinger), sendo talvez mais conhecidas as suas experiências com “fotões entrelaçados”, partículas descritas por possuírem as mesmas propriedades e que se “transformam” da mesma maneira onde quer que estejam, apresentando ainda a propriedade de adquirirem instantaneamente qualquer modificação ocorrida pela outra. Imagine: se um dos fotões entrelaçados mudar de cor o seu “companheiro” muda instantaneamente para a mesma cor e vice versa.
Este assunto, que foi capa do número de Abril de 2000 da revista Scientific American, volta a surgir agora na primeira página da edição desta semana da prestigiada revista Nature. Num artigo publicado na edição de 17 de Junho (M. Riebe et al. Deterministic quantum teleportation with atoms, Nature, 2004, 429, 734 – 737) uma equipa de cientistas, da qual Zeilinger também faz parte, do Instituto de Informação e Óptica Quântica de Innsbruck, na Áustria, comunicou os seus resultados sobre teletransporte quântico, anunciando que conseguiram, pela primeira vez, teletransportar informação de um átomo para outro. Os investigadores afirmam ter conseguido transferir informação quântica de um átomo de cálcio para outro átomo de cálcio, a uma temperatura próxima do zero absoluto (273ºC negativos). Realizar as experiências a esta temperatura é imprescindível uma vez que no zero absoluto todo o movimento atómico pára! Imobilizando desta forma os átomos de cálcio, os cientistas utilizaram as tais partículas entrelaçadas para provocar a transferência de informação: dois átomos com as mesmas características com fotões entrelaçados numerados por 2 e 3, no zero absoluto. Quando, por exemplo, o átomo 2 foi de determinada forma modificado por uma outra partícula numerada por 1, a alteração assim provocada transferiu-se imediatamente para o átomo de cálcio numerado com o 3 e que estava “entrelaçado” com o átomo número 2!
Uma das aplicações tecnológicas destas experiências é o desenvolvimento de “computadores quânticos”, caracterizados por possuírem uma velocidade de processamento de informação muito superior à dos actuais (que são binários) assim como poderem ter uma quase infinita capacidade para armazenar informação.
Enquanto aguardamos com espanto pelo avanço nesta área, não podemos deixar de ficar um pouco cépticos com este próprio conhecimento. Mas perante esta situação não posso deixar de citar uma frase famosa do cientista Sir Arthur C. Clarke, inventor do satélite de comunicações:

Toda a tecnologia suficientemente avançada é indistinguível da pura magia”.


António Piedade, escrito em 2004

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Entrevista a Carlos Fiolhais sobre Teoria Quântica






António Piedade - A que é que nos referimos quando adjectivamos de Quântica disciplinas como a Química e a Física?

Carlos Fiolhais - Referimo-nos à teoria quântica, que começou a ser proposta em 1900 e que ficou estabelecida nos anos 20 do século passado. Permite descrever o comportamento do mundo à escala atómica e subatómica, embora tenha consequências a escalas maiores. Uma boa parte da Física é quântica e podemos dizer que toda a química também é quântica, isto é, os seus fenómenos assentam nessa teoria. É uma teoria um pouco estranha pois as partículas atómicas e subatómicas não se comportam como os objectos do nosso dia a dia, mas até hoje ainda não foi contrariada por nenhum facto experimental.

AP - Que salto paradigmático ocorreu no nosso conhecimento sobre a matéria de que somos feitos, com a formulação, há mais de 100 anos, da Mecânica Quântica?

CF - A primeira mudança que custou a aceitar foi a proposta de Planck de que a energia associada à radiação era emitida não em quantidades arbitrárias, mas sim num certo número de quantidades discretas (os “quanta”). Pouco depois Einstein disse que a luz não era apenas emitida e absorvida em “quanta” mas que existia sob a forma de “quanta”: os fotões ou “grãos de luz”. A luz era, portanto, uma onda e uma partícula, por muito paradoxal que isso parecesse. Mais tarde, percebeu-se que partículas materiais como os electrões são, eles próprios, também partículas e ondas. E percebeu-se como os electrões se organizam nos átomos, como os seus “saltos” permitem a emissão e absorção de luz, e como os electrões funcionam como uma “cola” para unir átomos em moléculas ou sólidos. Percebeu-se ainda que as leis da física quântica são bem diferentes das da física clássica: por exemplo se sabemos a posição de um electrão, não podemos saber a sua velocidade (princípio de incerteza de Heisenberg).

AP - Quais as aplicações no nosso dia-a-dia do conhecimento entretanto acumulado pela mecânica quântica? Os computadores e as tecnologias da informação dependem dela?

CF - Sim, muita da tecnologia actual baseia-se na física quântica. Os transístores que estão em todo o tipo de aparelhos (por exemplo nos computadores e televisões) são dispositivos de base quântica. O laser, que está também por todo o lado (por exemplo, nos cabos de fibra óptica), é também um fenómeno quântico.

AP - Num artigo publicado primeiramente “on-line” na Nature Photonics, investigadores do Departamento de Electrónica e Telecomunicações da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, em Trondheim (aqui), dizem terem conseguido aceder, como “hackers”, a uma chave quântica secreta, que era a garantia de segurança da informação trocada entre dois dispositivos electrónicos, disponíveis no mercado, ligados remotamente entre si por fibra óptica. Alegam terem assim mostrado a falibilidade das chaves quânticas. O que é a criptografia quântica e quais as suas aplicações actuais?

CF - A criptografia quântica é o uso das leis da física quântica para assegurar a privacidade das comunicações à distância (essa privacidade é exigida, por exemplo, quando fazemos operações bancárias no multibanco ou na Internet com o cartão de crédito). É uma das modernas aplicações da mecânica quântica. O referido artigo critica alguns aspectos de uma técnica particular. Não invalida a criptografia quântica, em geral, que é uma das esperanças para melhorar a segurança das nossas operações mais reservadas.

AP - As chaves quânticas são comuns nas Tecnologias da Informação Computadorizada? Pode dar-nos exemplos da sua utilização?

CF - A criptografia está a começar a ser usada e não há ainda exemplos de utilização corrente. Mas há protótipos. A actual criptografia tem base uma mais matemática do que física, mas funciona bastante bem! A criptografia que vier a ser adoptada no futuro funcionará decerto ainda melhor…

AP - Na sua opinião, qual é a relevância deste artigo para a robustez dos sistemas que baseiam na Criptografia Quântica?

CF - Qualquer novidade científico-tecnológica, como a criptografia quântica, tem de ser criticada e testada. Artigos como este são muito úteis pois permitem escolher melhor os sistemas a adoptar. É curioso que, passados mais de cem anos desde a sua fundação, a teoria quântica continue a dar aplicações novas. E não é apenas na criptografia. A nanotecnologia – a engenharia à escala atómico-molecular – também promete novos benefícios para todos nós…


Publicado no dia 7 de Setembro de 2010 no Diário de Coimbra

Sobre a Teoria Quântica



Mais de cem anos depois de ter sido formulada a teoria quântica, que permite a mais exacta descrição e predição do comportamento das partículas atómicas e subatómicas (electrões, quarks, mesões, protões, neutrões, etc.), verifica-se um grande desconhecimento sobre o seu conteúdo, limites e aplicações. Por outro lado, a teoria continua a “dar-nos” aplicações tecnológicas surpreendentes e que tendem a tornar o nosso mundo mais seguro contra os usurpadores e abusadores da liberdade e dos direitos humanos.

Um bom exemplo é o artigo que agora acaba de ser publicado na Nature Photonics (aqui). Investigadores noruegueses conseguiram abrir uma chave de segurança, baseada em propriedades quânticas, entre dois equipamentos comerciais remotos ligados através de fibra óptica. Comunicaram a sua descoberta ao fabricante dos equipamentos, supostamente invioláveis, que de pronto corrigiu o problema para garantir a segurança de informações partilhadas. Assegurada essa segurança, os investigadores publicaram o seu trabalho, alertando para a infalibilidade destes sistemas julgados infalíveis, tudo isto em resultado da inteligência e do profundo conhecimento da teoria e suas aplicações.

Contraste antípoda é o desconhecimento generalizado na população, de facto transversal a todo o espectro de formações (poder-se-ia falar de uma iliteracia quântica), que permite aos modernos negociantes de “banha da cobra” utilizarem o adjectivo quântico para iludir a eficácia do efeito placebo: o mesmo produto (frasquinho de elixir, geleias encapsuladas, tiras de plástico para pulseiras feitas em qualquer fábrica oriental, muito provavelmente por trabalho infantil) causa o mesmo efeito do que aquele que seria obtido pela mesma pessoa se esta se convencesse que iria melhorar do seu desânimo, da sua falta de equilíbrio, da sua baixa autoconfiança e por aí fora, sem gastar um só cêntimo. O mesmo efeito resultaria se a pessoa mudasse do modo sedentário para outro mais móvel, ou se reflectisse sobre a causa real do seu estado. Mas reflectir, pensar, raciocinar, fazer uso do cérebro, órgão que é capaz das normais funções cognitivas para além das simplesmente reflexas, dá muito trabalho, cansa muito. É muito mais fácil pagar (normalmente exige-se dinheiro) e acreditar reflexamente que um produto “vazio”, mas embrulhado com as palavras “que quero ouvir”, vai resolver os meus problemas, sem qualquer esforço.

Neste contexto, muito actual, importa dizer que a teoria quântica é válida e útil para estudar e descrever o comportamento dos átomos e das partículas que os compõem e que, por isso, se dizem subatómicas. Para descrever e entender o comportamento de corpos a escalas humanas e superiores, a mecânica clássica newtoniana (pré-relatividade) continua a ser válida e suficiente. Aliás, a mecânica clássica continua a ser útil e bastante para colocar um satélite em órbita geoestacionária ou mesmo para enviar uma sonda até Saturno. Mas, em rigor, será mesmo assim? Nem por isso. Se o corpo teórico clássico é suficiente para descrever o comportamento do satélite ou sonda, tendo em conta as forças gravíticas envolvidas entre ele, a Terra e os outros planetas, para o enviar e para controlar o seu movimento são necessários inúmeros equipamentos electrónicos, são necessárias tecnologias da informação. E estas últimas foram e são o resultado de aplicações da teoria quântica que descreve as propriedades dos electrões na matéria e dos fotões na radiação, assim como as respectivas interacções. Sem este conhecimento não é possível, por exemplo, entender as propriedades dos semicondutores. E, por isso, não teria sido possível inventar o transístor, os circuitos integrados, os “chips” electrónicos, etc. E, sem estes, não haveria a informática e as telecomunicações que hoje nos envolvem e trespassam.

Paradoxalmente, a teoria quântica é imprescindível para que o comando da sua televisão (uma hoje banal aplicação tecnológica) funcione e, sob a ordem do seu polegar todo-poderoso, assista a uma operação de “marketing" dito quântico, no novo palco feirante, agora hertzianamente difundido, dos vendedores de ilusões. Nem precisa sequer de se mover do sofá para aumentar o estado da sua ignorância.

António Piedade, publicado no Diário de Coimbra a 7 de Setembro de 2010


http://dererummundi.blogspot.com/2010/09/sobre-teoria-quantica.html